Religião

 

A história da religião no Japão regista um longo processo de influência mútua entre diferentes tradições religiosas. Diferentemente do que ocorreu na Europa, onde o cristianismo tomou o lugar das tradições pagãs locais, a religião proveniente do Japão, conhecida como shintoísmo (shinto), continuou presente na vida quotidiana, desde os primeiros dias do Estado japonês organizado até a actualidade.

No século VI, com a introdução do Budismo no Japão, as crenças shintoístas e budistas começaram a interagir e este é o carácter distintivo da religiosidade japonesa, um exemplo desta interacção é a teoria de Honji Suijaku, segundo a qual as divindades shintoístas (kami) são consideradas encarnações dos seus entes budistas.

Budismo

 

O Budismo surgiu na Índia por volta do século 5 antes de Cristo, de seguida, esta religião começou na Índia, difundiu-se pela China durante os séculos 2 e 3 d.C. e, finalmente, chegou ao Japão, através da Coreia, na segunda metade do século 6, quando um dos seus reis enviou ao Imperador japonês uma estátua do Buda e várias cópias de escrituras sagradas (sutras). Esta religião, que tem como Deus HOTOKE-SAMA, espalhou-se muito rapidamente entre as classes mais altas, e o príncipe Shotoku (574 – 622), responsável pelo apoio imperial à construção de templos importantes como o Horyuji (actualmente na província de Nara), é considerado o verdadeiro fundador do budismo no Japão.

 

Esta religião foi adoptada como religião oficial do estado, pelo Imperador Shomu e teve uma grande influência na escrita, na arquitectura e na escultura japonesas. Contudo, existem variadas formas de Budismo, em que algumas envolvem crenças de que o céu e a terra, homem e natureza, são um só e, por fim, a meditação pessoal que conduzirá à paz interior, pois o tempo livre é utilizado para pensar tranquilamente. Para que seja possível louvar Buda fazem-se estátuas por todo o país, uma das maiores é o grande Buda em Nara, no Templo de Todaiji, que tem 16 metros de altura – a maior estátua de bronze do mundo.

 

Contudo, a coexistência do budismo e do shintoísmo não acabou, encarregues da realização de rituais para promover o bem-estar nacional, as seis seitas de Nara, que dominavam o budismo naquele momento, possuíam um carácter académico e tinham pouca influência sobre a população em geral. No início do período Heian (794 – 1185), a seita Tendai foi introduzida no Japão pelo missionário Saicho (767 – 822), a seita Shingon foi importada por Kukai (774 – 835), também conhecido como Kobo Daishi. Assim, estas duas correntes tornaram-se as mais importantes na corte imperial.

 

No período Kamakura (1185 – 1333), ocorreram, no budismo japonês, dois desenvolvimentos importantes. Primeiro, o Zen estabeleceu-se no Japão com Eisai (1141 – 1215), fundador da seita Rinzai; sendo mais tarde modificado por Dogen (1200 – 1253), fundador da seita Soto. Apesar de tudo, o Zen foi bem recebido pela elite militar devido à sua objectividade e ao realce da auto-disciplina e da meditação. A prática Zen emprega a meditação em posição sentada (zazen) e os enigmas (koan) como meios para alcançar a iluminação (satori). Entre estas duas seitas a principal diferença é o facto de o Zen Rinsai dar mais valor ao koan do que o Zen Soto. O outro desenvolvimento importante foi o crescimento rápido de seitas populares budistas entre o povo comum, aqui incluem-se as seitas da Terra Pura, que pregam a entoação do nome do Buda Amida como o melhor caminho para encarnar no Paraíso, e a seita Nichiren, que enfatiza a entoação do título do Sutra de Lótus.

 

No período Edo (1600 – 1868), o Xogunato Tokugawa – ditadura militar feudal – exigiu que toda a população se associasse a um templo budista, para que conseguisse controlar os habitantes e erradicar o cristianismo. Esta medida garantiu um grande número de membros, mas não contribuiu para fortalecer o budismo como uma religião viva.

 

No começo do período Meiji (1868 – 1912), o sistema entrou em colapso numa vaga de sentimentos anti-budistas estimulada pelo desejo que o governo tinha, o de eliminar o predomínio budista nos santuários shintoístas e tornar o shintoísmo a religião do estado. Para dar resposta a isso e às transformações ocorridas durante o século XX, o budismo tem procurado definir o seu papel no Japão moderno.

 

Xintoísmo

O Xintoísmo, que vem da palavra Xinto, termo frequentemente traduzido como “caminho do deuses” e escrito com dois ideogramas chineses. O primeiro ideograma (pronunciado kami quando empregado isoladamente) significa “Deus”, “divindade” ou “energia divina”; o segundo ideograma quer dizer “caminho”. Com a introdução do sistema de plantação em campos alagados durante o período Yayoi (300 a.C. - 300 d.C.), surgiram os rituais e festivais agrícolas que mais tarde se tornaram parte do xintoísmo.

 

Embora a palavra kami possa designar um único deus, também é usada como um termo colectivo para designar a enorme quantidade de deuses cultuados no Japão desde o período Yayoi. Os kami fazem parte de todos os aspectos da vida e manifestam-se sob várias formas. Há kami da natureza que residem em pedras, árvores ou montanhas sagradas, bem como em outros fenómenos naturais. Há os ujigami ou kami protectores de um conjunto de famílias ligadas por um antepassado comum, que consistem, muitas vezes, na divinização do próprio antepassado. Há o ta no kami, deus dos arrozais, adorado nos festivais de plantação e colheita do arroz. E há também os ikigami que são divindades vivas. Os kami que mais se assemelham a deuses, segundo o conceito ocidental, são as divindades celestes, que habitam o Takamagahara (Alta Planície Celestial), estes são chefiados por Amaterasu Omikami, a deusa cultuada no templo de Ise, o santuário central do xintoísmo. 

 

Esta religião vem do naturalismo e da movimentação dominantes entre os japoneses primitivos que viam a divindade em todos os fenómenos, não só na natureza, como também nos espíritos mortos.

A partir do século 6, em parte, para resposta à introdução, no Japão, de doutrinas budistas altamente estruturadas, crenças e rituais nativos vastamente difundidos, foram sistematizados aos poucos, constituindo o xintoísmo. O desejo de dar legitimidade à linhagem imperial numa sólida fundamentação mitológica e religiosa levou à compilação do Kojiki (Registo das Coisas Antigas) e do Nihon Shoki (Crónicas do Japão), nos anos 712 e 720, respectivamente. Traçando uma retrospectiva da linhagem imperial até a era mítica dos deuses, essas obras narram como os kami Izanagi e Izanami criaram o arquipélago japonês e os deuses centrais Amaterasu Omikami (deusa do sol), Tsukuyomi no Mikomi (deus da lua) e Susanoo no Mikoto (deus das tempestades). Segundo a narrativa, o tataraneto da deusa Amaterasu Omikami foi o imperador Jimmu, primeiro lendário soberano do Japão.

A ausência de escrituras sagradas no xintoísmo reflecte a inexistência de mandamentos morais. Em lugar destes, é enfatizada a pureza ritual nas relações com os kami.

Contudo, o Xintoísmo, que tem como Deus KAMI-SAMA, é uma religião tradicional no Japão da qual os seus seguidores veneram o mundo natural – os animais, as plantas, as pedras e todos os lugares de grande beleza – e, para eles os antepassados e os velhos heróis também são sagrados, onde, nos primórdios, o Imperador era um dos seus deuses. Para as pessoas doutras religiões, nomeadamente as do Ocidente, o Xinto é difícil de entender pois tem poucas horas estabelecidas para adoração e poucas rezas regulares, mas afecta muitos aspectos da vida quotidiana japonesa e do pensamento, como os períodos destinados à meditação. Porém, o Japão possui cerca de 80 000 santuários de Shinto mas o principal é o Santuário Grande em Ise, onde muita gente vivia nos velhos tempos.

Normalmente, todo o povo japonês costuma ter, em cada casa, um altar com o nome dos seus antepassados que são cultuados diariamente, oferecendo alimentos simbólicos e o culto propriamente dito, com rezas para purificar os espíritos dos que já morreram e dos que ainda estão vivos.

 

Cristianismo

 

A história da presença cristã no Japão divide-se em três períodos: o encontro inicial, que aconteceu durante o século XVI; a reintrodução que ocorreu no século XIX; e, por último o período pós-guerra.

 

O encontro inicial aconteceu com a chegada do missionário jesuíta Francisco Xavier a Kagoshima, no mês de Agosto de 1549. As actividades propostas pelos missionários jesuítas estavam concentradas em Kyushu, a cidade mais meridional das quatro maiores ilhas japonesas. Durante o ano de 1579, seis daimyo (governantes militares regionais) foram convertidos e estimava-se a existência de 100 mil cristãos. Inicialmente, os jesuítas eram muito bem tratados pelos prestigiosos governantes militares, tais como o Oda Nobunaga e o Toyotomi Hideyoshi. Porém, a crescente influência jesuíta em Kyushu levou a que Hideyoshi ficasse contra os cristãos e mandasse crucificar 26 deles em Nagasaki, no ano de 1597. Durante o ano de 1614, Tokugawa Ieyasu, governante do Japão, expulsou o cristianismo através do despejo dos missionários que lá estavam. Estima-se que, naquela época, existiam mais de 300 mil cristãos japoneses, dos quais cerca de 3 mil foram executados e um grande número negou a sua fé devido à perseguição de que estavam a ser alvo, outra grande parte decidiu esconder a sua crença praticando o cristianismo na clandestinidade.

 

A reintrodução desta religião deu-se depois de o Japão abolir a política da exclusão, quando os missionários estrangeiros começaram a regressar no ano de 1859, mas catequizar mais abertamente só depois de 1873. Durante esta etapa, mais de 30 mil dos cristãos que estavam escondidos apareceram, estes encontravam-se clandestinos à mais de dois séculos de perseguição. Devido ao seu aparecimento, nesta época, estavam em actividade tantos missionários católicos como protestantes e, embora o número de convertidos fosse relativamente pequeno, os cristãos tornaram-se importantes na educação e nos movimentos sindicais. Todavia, o crescimento do nacionalismo e a promoção das práticas shintoístas como dever patriótico levou a que os anos 30 fossem um período muito difícil para muitos dos cristãos.

 

Depois do período do pós-guerra, ou seja, a época posterior à Segunda Guerra Mundial, a actividade cristã teve o apoio das autoridades públicas, tendo havido apenas reduzidos avanços. Assim, no ano de 1996, os 3 170 000 cristãos japoneses perfaziam 2,5% da população. Embora exista uma crescente popularidade das cerimónias de casamento cristãs, para muitos japoneses, o cristianismo provavelmente ainda é visto como uma religião estrangeira. Apesar de tudo, não se pode dizer que esta seja totalmente desconhecida pois o conhecimento e o interesse a seu respeito tem vindo a aumentar com o passar dos anos, contudo, esta familiaridade não se reflecte no aumento do número de fiéis. Talvez seja causa desta discrepância o ênfase na fé exclusiva no Deus único cristão, o que implica a rejeição do politeísmo.

 

Outras Religiões

 


Existem ainda outras religiões que foram “importadas” e que desempenham um papel importante na sociedade japonesa, por um período de mais de mil anos. O Confucionismo é uma dessas religiões, que foi introduzida no Japão no inicio do século VI, e os seus preceitos mostraram ter uma grande influência sobre o pensamento ético e político do Japão, no período da formação do Estado (entre os séculos VI e IX) e durante o período Edo (entre 1600 e 1868). Esta religião foi marcante para o pensamento e para o comportamento dos japoneses até ao fim da Segunda Guerra Mundial, quando começou o seu declínio.

 

Outra dessas religiões é o Taioísmo do qual a sua influência religiosa no Japão pode ser encontrada no uso do calendário lunar chinês e em crenças populares, tais como as artes divinatórias e as orientações para obter a boa sorte.

 

A Religião no Japão Actual

Devido a um templo budista ou santuário shintoísta específico, a urbanização destruiu as famílias de muitos japoneses, mesmo assim, muitas pessoas consideram-se pertencentes às duas religiões – o Budismo e o Shintoísmo. Contudo, o número total de fiéis das duas religiões, segundo a Agência de Assuntos Culturais em 1996, é de aproximadamente 194 milhões, que corresponde a cerca de 54%, mais do que a população total do Japão. Quanto aos sentimentos religiosos, para a maioria dos japoneses, o shintoísmo e o budismo convivem pacificamente, para uma pessoa normal, a afiliação religiosa não implica a participação regular nos cultos, pois a maior parte só visita um santuário ou um templo em ocasiões de eventos anuais e cerimonias especiais que marcam certos momentos da vida.

Actualmente, no Japão, a liberdade de escolher a religião é assegurada a toda a população pela Constituição de 1946 que prescreve: “Nenhuma organização religiosa receberá privilégio do Estado nem exercerá qualquer autoridade política. Nenhuma pessoa será obrigada a participar de qualquer acto religioso”. Devido a isto, o povo japonês é harmonioso, pois não faz distinção de religiões, ou seja, para este povo, o shintoísmo existe lado a lado com o budismo.

 Muita desta população leva os seus filhos, de 7, 5 e 3 anos, o que é chamado festival de SHICHIGOSAN, para o templo shintoísta, com vista a rezar pela saúde e pelo sucesso dos seus filhos. Quando há algum casamento, a cerimónia é celebrada segundo o ritual shintoísta, todavia quando alguma pessoa morre, o seu funeral é realizado de acordo com o ritual budista.

Porém, os templos destas duas religiões são distinguíveis devido às cores predominantes em cada um. Um templo shintoísta tem sempre um Torii, o portal à entrada e as cores tónicas são o vermelho e o dourado, enquanto que num templo budista as cores tónicas são o preto, o violeta e o dourado, nas duas religiões está presente, no altar, o grande Buda, originário da Índia.

Contudo existe um mito acerca da origem divina da família imperial que se tornou base da religião shintoísta, por isso, o imperador também foi considerado um Deus do povo japonês até ao fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945. Actualmente, segundo a nova Constituição pós-guerra, o imperador é o símbolo da nação e da unidade do povo.